“A bariátrica não é a solução para a obesidade, ao meu ver, ela foi a minha segunda ou milésima chance, um novo jeito de tentar, a diferença entre todos os métodos de emagrecimento que eu tentei, é que eu fiz a bariátrica sabendo todo o processo, me preparei para isso e vivi, buscando melhorar meus hábitos”, diz Vanessa Wanzeler, maquiadora e influenciadora digital paraense.
Segundo a Secretaria de Saúde do Estado do Pará (Sespa), o número de pessoas obesas tem crescido tornando a doença um problema de saúde pública. De acordo com dados do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (Sisvan) do Ministério da Saúde em 2021, no Pará, 37,5% dos adultos apresentavam excesso de peso. O Atlas Mundial da Obesidade 2022 mostra que o Brasil deve ter quase 30% de adultos obesos em 2030. A pesquisa foi realizada pela Federação Mundial da Obesidade, organização voltada para a redução e o tratamento da doença.
Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil perdeu 36.331 vidas nesta pandemia de pessoas com obesidade, o que é um fator de risco para o agravamento de quadros da Covid-19. Por conta desse cenário, o Ministério da Saúde classificou a cirurgia bariátrica como um dos procedimentos eletivos essenciais e deverá ser priorizada na saúde pública. A obesidade é considerada como um distúrbio crônico e caracteriza-se pelo acúmulo excessivo de gordura corporal. Alguns fatores são apontados como causas da doença: os genéticos, individuais, comportamentais e ambientais.
A paraense Vanessa Wanzeler é maquiadora e influenciadora nas redes sociais. Ela relatou ao Redação News detalhes do processo pré e pós-cirurgia bariátrica. “Acredito que tudo começou quando eu tinha 14 anos e minha mãe sofreu um acidente grave. Ao ver minha mãe em situação tão dependente de mim, percebi que tinha ganhado uma responsabilidade até mesmo maternal, trocamos de lugar, eu que era filha, passei a ser a mãe. Aos 17 anos fui embora para Brasília, na tentativa de arrumar emprego para poder pagar uma faculdade, porém tudo era muito diferente lá e o impacto foi grande. Em um mês engordei 10 kg. Estava trabalhando sem receber meu pagamento há meses, a empresa sumiu e as contas só aumentavam, meus colegas de trabalho me doavam alimentos não perecíveis, esse é só um dos exemplos de situações que colaboraram para o meu processo de engordamento”, relata.
Vanessa conta que o processo de obesidade estava totalmente ligado ao emocional. “Anos depois, já formada, estava bem, trabalhando na minha área, com um bom cargo, realizei o meu sonho: trazer a minha mãe para morar comigo em Brasília. Estava tudo bem e ela feliz de estar comigo. Foi quando veio a crise em 2016 e fiquei desempregada, tive que vender tudo o que havia conquistado para poder alimentar a gente e honrar o aluguel. Quando já não tinha mais nada, tivemos que voltar ao Pará,” diz a maquiadora.
As dívidas e o fato de voltar a depender financeiramente da minha família me deprimiam, meu processo de engordar está totalmente relacionado ao meu emocional, cheguei a pesar 110 kg, até que eu engravidei e ouvi do meu médico que eu não poderia engordar mais nada para não entrar para gravidez de risco. Aquilo pra mim foi um despertar para a vida, eu me deixei largada a vida toda, sempre preocupada em me estabilizar pra poder cuidar da minha mãe e a saúde sempre tinha que esperar. Vanessa Wanzeler, maquiadora e influenciadora digital paraense.
Vanessa conta que chegou a emagrecer durante a gravidez, mas na mesma época veio a pandemia, e ela pegou covid-19 e engordou tudo de novo, por conta de corticóides, foi quando ela começou a pensar em fazer a cirurgia bariátrica. “Eu sentia muitas dores na coluna por ter seios grandes, levantei o valor da cirurgia de redução de seios através das redes sociais, mas os médicos me diziam que não iria resolver, a solução era emagrecer. De tanto ouvir isso, minha mente se abriu para a bariátrica e então continuei trabalhando até conseguir o dinheiro da cirurgia. Operei com 98 kg, hoje peso 60 kg, com novos hábitos, muitas mudanças positivas, algumas pequenas consequências e uma certeza: só podemos ajudar as pessoas quando primeiro nos ajudamos”, expõe Vanessa.
“Como alguém que não está bem, que não se cuida vai conseguir ajudar alguém? Hoje eu entendo o que é dito nas aeronaves pelos comissários de bordo: Máscaras de oxigênio irão cair em caso de emergência, coloque em você primeiro e só depois ajude a colocar em outras pessoas”.
Segundo a Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (Sespa), em 2020 foram realizadas 32 cirurgias bariátricas, em 2021 foram 212 cirurgias e até novembro de 2022 foram realizadas 453 cirurgias. É possível fazer a cirurgia pelo SUS por meio do programa Obesidade Zero, voltado a pacientes com Índice de Massa Corporal (IMC) maior que 35 kg/m² e que obedeçam aos demais critérios para a realização de cirurgia bariátrica.
Os pacientes são atendidos por uma equipe multidisciplinar, onde serão avaliados se estão aptos ou não para fazer a cirurgia. Caso sejam elegíveis, a cirurgia bariátrica poderá ocorrer em até dois anos, conforme prazo preconizado pelo Ministério da Saúde, já que o tratamento inclui também o atendimento multiprofissional pré e pós-cirurgia. A Sespa informa, ainda, que os procedimentos cirúrgicos são realizados somente em usuários a partir de 18 anos. As inscrições podem ser feitas pelo site do programa.
Para Vanessa, é importante fazer a bariátrica entendendo todo o processo. “Me preparei para isso e vivi o processo, buscando melhorar meus hábitos, hoje compartilho nas minhas redes sociais a minha rotina, o meu emagrecimento e encorajar pessoas a fazerem o mesmo. Meu bordão é: você é maravilhosa (o), inspirado na mulher maravilha, fiz até uma tatuagem comemorativa do símbolo dela para representar o alcance da meta de peso”, relata.
O médico responsável pela cirurgia bariátrica deve ser um cirurgião geral ou do aparelho digestivo. Ele é o responsável pela intervenção cirúrgica e, por isso, deve acompanhar o paciente antes e depois do procedimento. Conversamos com o Doutor Helder Ikegami, que realiza a cirurgia no Pará, ele orienta que primeiro o paciente procure um médico do aparelho digestivo e essa pessoa já tem que ter feito algum tratamento clínico de perda de peso antes, pois segundo ele, a cirurgia não pode ser a primeira opção.
“A pessoa tem que ter passado já em consulta com nutricionistas, nutrólogos, endócrinos antes e o tratamento não ter surtido efeito. O acompanhamento é um pré-operatório, onde esse paciente vai ter que passar por uma série de avaliações com cirurgião, com cardiologista, endocrinologista, nutrólogo, pneumologista e inclusive o psicólogo. Cada profissional desse vai emitir um laudo dando parecer favorável ou não à realização da cirurgia. Se for favorável, aí nós indicamos a cirurgia e podemos realizar”, orienta o médico.
Conforme os especialistas, o acompanhamento psicológico também é muito importante nesse processo. O Redação News conversou com a psicóloga Keila Dias, que trabalha acompanhando pacientes bariátricos, e diz que “a psicoeducação para pacientes recém operados, funciona dentro da sessão do acompanhamento, onde é trabalhado tudo de novo que o médico e o nutricionista exigem que o paciente siga, e principalmente no primeiro mês onde a restrição alimentar é muito grande e também a mudança de rotina”, informa a psicóloga.
Na avaliação psicológica de pré operatório, a psicóloga trabalha a anamnese, que é a história de vida do paciente desde o início da obesidade até a decisão da cirurgia. “Aplicamos teste psicológico para avaliar se existe algum transtorno mental que possa implicar na adesão dele nos protocolos de pós operatório. Trabalhamos também a adesão de um estilo de vida saudável para sempre e chamo a família para saber como é a rotina deles social e alimentar e o suporte que eles vão dar para o meu paciente. Trabalhamos o humor também, que altera com tantas mudanças e através do suporte psicológico, vamos ajudá-lo a passar por essas fases da melhor forma possível”, explica a especialista.
O Doutor Helder Ikegami acredita na eficácia do acompanhamento pós-operatório. “Depois da cirurgia, esse paciente continua sendo acompanhado mensalmente, onde ele faz exames, onde é conversado sobre como está a alimentação, sobre a aceitação da dieta, sobre a quantidade de peso que está perdendo, e então ele é submetido a um acompanhamento da equipe, continuamente até mais ou menos um ano de cirurgia, que é o tempo que ele perdeu a maioria do peso dele e deve se encontrar próximo ao peso ideal”, conta o médico.
A orientação da psicóloga Keila Dias também é que o paciente procure um cirurgião de confiança e mais, “faça todo o seu pré-operatório com uma equipe multidisciplinar que seja referência em pacientes bariátricos e que entenda que a obesidade é uma doença crônica e que você precisa cuidar com ajuda da sua equipe o resto da vida”, orientou a psicóloga.
Esta reportagem foi produzida com apoio do programa Diversidade nas Redações, da Énois, um laboratório de jornalismo que trabalha para fortalecer a diversidade e inclusão no jornalismo brasileiro. Confira as metodologias na Caixa de Ferramentas.